Especialistas discutem esses dados de 2012 a 2018 informando os impactos dos acidentes e doenças de trabalho e a importância da cultura de prevenção
Para compor as discussões relacionadas à saúde e segurança no trabalho, a Fundacentro convidou a procuradora da Advocacia Geral da União (AGU), Marta Vilela Gonçalves; a chefe da Seção de Segurança e Saúde no Trabalho, Renata Matsmoto, e o auditor fiscal Antônio Pereira, ambos da Superintendência Regional do Trabalho do Estado de São Paulo (SRT); o perito médico Previdenciário do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Eduardo Costa Sá; e da instituição, o tecnologista e chefe da Coordenação de Segurança no Processo de Trabalho (CPT), José Damásio de Aquino.
Desde que a data de 28 de abril em Memória das Vítimas de Acidentes e Doenças Relacionadas ao Trabalho foi instituída, diversas entidades realizam ações para fomentar a cultura de segurança e saúde no trabalho.
De acordo com dados do Observatório Digital de Saúde e Segurança do Trabalho, de 2012 a 2018, o Brasil registrou 16.455 mortes e 4.5 milhões acidentes. No mesmo período, gastos da Previdência com Benefícios Acidentários corresponderam a R$79 bilhões, e foram perdidos 351.7 milhões dias de trabalho com afastamentos previdenciários e acidentários.
Ações regressivas
A ação regressiva acidentária é fundamentada por meio do artigo nº 120 da Lei nº 8.213/1991, tendo por finalidade obter o ressarcimento das despesas decorrentes de acidente de trabalho e doenças profissionais pela falta do cumprimento de normas de segurança e higiene do trabalho. Diante disso, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) propõe ações regressivas contra as empresas/empregadores, especialmente quando o empregador é quem cria o risco por meio de sua atividade econômica (empresa).
“Está previsto na Constituição Federal que, além do seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, independente de dolo ou culpa, não exclui a indenização a que este está obrigado”, afirma a procuradora da Advocacia-Geral da União (AGU), Marta Vilela Gonçalves.
A procuradora apresenta o cenário passado e o atual, informa que no período de 1991 a 2001, no âmbito do INSS e da Procuradoria Geral Federal, as ações regressivas não recebiam um tratamento mais eficaz. Nesse período a média de ajuizamento era de 16 ações por ano.
Porém, a partir de 2007, com a Resolução do Conselho Nacional de Previdência Social nº 1.291 foi recomendado ao INSS à adoção de medidas cabíveis para ampliar a propositura de ações regressivas contra os empregadores considerados responsáveis por acidentes do trabalho.
Na fase intermediária, de 2008 a 2015, a AGU elegeu por meio da Procuradoria Geral Federal (PGF) que representa o INSS, a atuar de forma mais firme, foi necessário buscar parcerias com instituições, tais como Ministério Público do Trabalho (MPT); Justiça do Trabalho; Ministério da Saúde; Ministério do Trabalho e com os Sindicatos. “Quando o INSS busca o ressarcimento e/ou a reposição do fundo de previdência social, as parcerias são importantes para que o instituto demonstre por meio de provas que houve negligência por parte do empregador”, salienta Marta. Completa que nesses oito anos, a média de ajuizamento foi de 438 ações.
A partir de 2016, a procuradora descreve que por meio da Portaria PGF nº 157/2016, foi criada a Equipe de Trabalho Remoto (ETR). “São procuradores federais que atuam no Brasil inteiro, os quais analisam documentações que são encaminhadas geralmente pela fiscalização do trabalho, para verificar casos em que o empregador tem culpa. Além disso, existe o Núcleo de Ações Prioritárias (NAP), também formado por procuradores federais, no âmbito de cada unidade da PGF para acompanhamento das demandas”, exalta.
Ações ocorridas em 2018
De acordo com a procuradora, a AGU ajuizou 395 ações regressivas, tendo como expectativa a recomposição do fundo da previdência social em 563 benefícios cobrados e esses acidentes envolveram 465 trabalhadores. O valor cobrado foi de R$ 24.061.196,55, a expectativa é que sejam ressarcidos R$ 173.720.091,75 ao INSS que já desembolsou na concessão do benefício acidentário.
“A ação regressiva é um relevante instrumento de concretização da política pública de prevenção de acidentes e doenças do trabalho”, frisa Marta.
Impacto dos acidentes e a educação em SST
Além de gerar um custo altíssimo para o INSS, as consequências dos acidentes de trabalho causam prejuízo para os trabalhadores e familiares, para a empresa e, também, para o governo. Endossando a informação da procuradora Marta Gonçalves, o perito-médico previdenciário do INSS, Eduardo Costa Sá, comenta que “a legislação previdenciária brasileira foi estabelecida na Constituição Federal de 1988. O perito-médico está no final do processo, constatamos a incapacidade para o trabalho”, informa.
O perito-médico analisa a existência da doença, bem como a profissão do segurado e a forma como é executada. Ou seja, traça o perfil profissiográfico, o registro da profissão no Cadastro Brasileiro de Ocupação (CBO) e noções básicas de higiene e saúde no trabalho.
Eduardo Sá descreve que a Seguridade Social é composta por três pilares: Saúde (prevista no Artigo nº 196 a 200); Assistência Social (prevista no artigo nº 203 a 204) e a Previdência Social (prevista no artigo nº 201 e 202), todos os artigos estão na CF/88.
Para ele, a prevenção de acidentes é fundamental. “De acordo com dados oficiais, o Brasil ocupa o quarto lugar em acidentes e doenças relacionadas ao trabalho. De 2018 até 29 de março deste ano, foram registrados 802 mil acidentes de trabalho, resultando em 2.995 mortes”, exalta Eduardo.
O perito-médico ressalta que os acidentes de trabalho influenciam no desenvolvimento do país. “O artigo nº 161 da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), se o ambiente laboral coloca o trabalhador em condições de risco grave ou iminente, a empresa além da multa poderá ser interditada, o que ocasionará inúmeros prejuízos. É obrigação da empresa adotar e cumprir medidas de proteção à saúde e segurança do trabalhador”, frisa.
Além de medidas de prevenção e normas, Eduardo enfatiza que a educação é uma das grandes ferramentas para reduzir os índices altos de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho. Completa que precisa maior fiscalização, melhor uso das ferramentas disponíveis para controle dos acidentes como exemplo, o Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário (NTEP), acidentes cadastrados no sistema da Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) e outros.
Impressões da auditória fiscal do trabalho
Utilizando dados da Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho (EU-OSHA), o auditor fiscal Antônio Pereira, da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Estado de São Paulo (SRT), enfatiza que as taxas de maiores índices de acidentes estão nos segmentos da construção, mineração, transporte e rural.
Para o auditor fiscal não faltam normas, mas o cumprimento delas. Sobre isso, as empresas que não possuem os programas estabelecidos pelas normas regulamentadoras nº 7 – Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) e nº 9 – Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) podem ser notificadas e autuadas.
“As empresas não cumprem o que determina a NR 7, e a ausência deste programa é considerado infração grave em uma fiscalização”, exalta Pereira.
O auditor fiscal do trabalho observa que, de acordo com dados da Health and Safety Executive (HSE), cresce o número de acidentes com trabalhadores acima de 60 anos. De 2017 a 2018, o índice de acidentes da Grã-Bretanha aponta que 144 trabalhadores foram mortos.
A taxa de ferimentos fatais em trabalhadores entre 60 e 64 anos correspondem ao dobro de todas as outras idades, já os trabalhadores acima de 65 anos têm uma taxa cinco vezes maior. “55% das lesões fatais correspondem aos trabalhadores com mais de 60 anos”, observa Antonio.
O auditor frisa que a falta de organização do trabalho, planejamento e procedimento vão de encontro a uma boa gestão da segurança e saúde no trabalho.
Gestão de riscos ocupacionais
Mundialmente, cerca de 7.500 mortes ocorrem diariamente devido as condições inseguras e insalubres. 6.500 são correspondentes as doenças relacionadas ao trabalho e 1.000 por acidentes ocupacionais, esses números são apontados pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Os dados acima foram apresentados pelo tecnologista José Damásio de Aquino, da Fundacentro, estão no relatório da OIT “A Safe and Health”. O estudo aponta que globalmente o número de mortes cresceu de 2,33 milhões em 2014, para 2,78 milhões em 2017.
Diante disso, José Damásio apresenta medidas eficazes de controle dos riscos existentes nos ambientes de trabalho, destaca a norma ISO 45001/2018 – Sistemas de gestão de segurança e saúde ocupacional, que fornece recomendações relacionadas às atividades necessárias para o processo de gestão de riscos.
O tecnologista explica a diferença entre perigo e fonte de risco. Risco é o elemento individual ou combinado que pode desencadear lesão ou morte, ou seja, perder um membro, intoxicação, ter problemas na coluna ou em qualquer outra parte do corpo devido às condições de trabalho. O perigo, por sua vez, é qualquer coisa que tem a probabilidade de causar danos, seja para as pessoas, propriedades e processos.
O processo de gestão de riscos define a prática de identificar os riscos, analisar, tomar medidas para reduzir o risco e avaliar os riscos para desenvolver estratégias de monitoramento e ações imediatas de segurança.
Tendências da SST no Futuro
Ainda a respeito do relatório da OIT, os números mais recentes englobam fatores ergonômicos, fatores de risco de lesões, materiais particulados, gases, fumos e ruído são os principais responsáveis pela maioria de doenças ocupacionais.
Neste ano, além da OIT, a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia lança a Campanha Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho (Canpat/2019).
Canpat 2019
Segundo dados oficiais, somente em 2017, foram registrados 549.000 acidentes de trabalho envolvendo óbitos, mutilações, afastamentos e incapacitações permanentes e temporárias. No entanto, os especialistas em suas apresentações informam que a notificação dos Acidentes do Trabalho é uma exigência legal, mas, de acordo com os dados estatísticos, existem as subnotificações.
A promoção de uma cultura de segurança e saúde no trabalho é o mote da Canpat, informa a chefe da Seção de Segurança e Saúde no Trabalho da Superintendência Regional do Trabalho do Estado de São Paulo (SRT), Renata Matsmoto. “Desde 1971, a Canpat se tornou de caráter permanente. A Campanha tem como objetivo despertar a consciência da sociedade sobre as questões da cultura de prevenção de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho”, salienta.
Completa ainda que o “Ministério da Economia, que englobou o Ministério do Trabalho, por meio da Secretaria do Trabalho e da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), por força do artigo nº 155 da CLT, do item 1.4 da Norma Regulamentadora nº 01, trata-se de um órgão de âmbito nacional o qual compete coordenar, orientar, controlar e supervisionar as atividades correspondentes à segurança e medicina do trabalho, sobretudo a Canpat”, salienta Matsmoto.
A chefe da SRT comenta que os acidentes de trabalho no mundo já correspondem a 4% do Produto Interno Bruto (PIB). De acordo com a OIT, este índice corresponde a 2,8 trilhões de dólares por ano. “Diante dos gastos com acidentes do trabalho, é fundamental investir em prevenção de acidentes”, frisa.
Fonte : Fundacentro/ACS – Débora Maria Santos em 03/05/2019